A CRIANÇA TRANSGÊNERO DA PERSPECTIVA PSICANALÍTICA

A CRIANÇA TRANSGÊNERO DA PERSPECTIVA PSICANALÍTICA

APAOR/COWAP Brasil

Rio de Janeiro, 19/06/2021

Maria do Carmo Cintra de Almeida-Prado

Jean-Pierre Caillot

Philippe Saielli

Jeanne Defontaine

Maurice Hurni

INTRODUÇÃO

Maria do Carmo Cintra de Almeida-Prado

Neste encontro entre a APAOR e o COWAP Brasil propomo-nos a pensar sobre uma questão que se apresenta, a meu ver, como um desafio para os psicanalistas, o que se convencionou chamar de “transtorno de identidade de gênero” (TIG). Creio que uma das primeiras questões que veem à mente ao abordá-lo diz respeito ao preconceito, algo a ser combatido. Abordar esse tema, ainda mais em se tratando de crianças e adolescentes, torna a tarefa ainda mais complexa. Que lugar ocupa a criança face às projeções inconscientes de seus pais? Qual legado lhe é designado e que ela, por motivos inconscientes, pode ser compelida a cumprir? Qual a posição do social e dos serviços assistenciais disponibilizados, sobretudo os médicos? Esses dispositivos estão diretamente relacionados a como os profissionais engajados nessa assistência concebem a questão e podem, assim, selar um destino.

O Laboratório Transdisciplinar de Estudos de Identidade de Gênero (LTEIG) do Hospital de Clínicas da Faculdade de Medicina da USP foi fundado em 2010 para acolher adolescentes; a primeira criança chegou em 2011 e em 2015 o laboratório fechou a entrada para adultos. Visa-se acompanhar essas pessoas ao longo da vida. A equipe é formada pelo médico psiquiatra, doutor em medicina pela USP, Alexandre Saadeh, e uma assistente social; os demais profissionais que nele atuam são voluntários. Em entrevista conduzida por Alexandra Makowiski em 7 de novembro de 2017, pelo You Tube, Saadeh assinala ter havido uma busca ao LTEIG 60% maior naqueles últimos 6 meses. Informa que é desenvolvido trabalho preventivo em escolas e abrigos para evitar o sofrimento dessas crianças.

De acordo com Saadeh, o transtorno de identidade de gênero tem base biológica e se estrutura ao longo da vida. Orientação sexual difere de identidade de gênero, que diz respeito a masculino e feminino ou alguma coisa entre eles (sic). Afirma que a consciência de eu se dá em torno dos 3-4 anos e as primeiras crianças recebidas no laboratório tinham essa idade. Entendendo que tudo começa na infância, associada à base biológica, há a parte social, com implicações legais, como as que dizem respeito à mudança de nome e gênero nos documentos.

Saadeh assinala a relevância de não diagnosticar o que não precisa ser diagnosticado – mas será que se diagnostica o que precisa ser diagnosticado? Observa que, na infância, a maioria desses diagnósticos diz respeito à homossexualidade, mas há um grande sofrimento que permanece até a puberdade, quando pode-se recorrer a bloqueadores hormonais até os 16 anos ou de acordo com prescrição médica, com utilização de hormônios voltados para a identidade de gênero do sujeito. A seu ver, esse acompanhamento permite que o diagnóstico seja firmado e o profissional tenha certeza.

Saadeh questiona: porque deixar a transformação acontecer? Até os 16 anos pode-se usar hormônios específicos, de acordo com a identidade de gênero, com isso, evitar-se-ia sofrimento. Que há sofrimento, não há dúvida, mas de qual sofrimento estar-se-á falando? Saadeh considera que o bloqueio hormonal é reversível, suspendendo-o, a biologia segue seu curso, como deveria ser.

A cirurgia de redesignação sexual é a etapa seguinte e a população transgênera a procura. Além da cirurgia genital, há a ablação das mamas. Saadeh a entende como uma cirurgia terapêutica, pois muda a história de vida do paciente. Por ocasião da entrevista, afirmou que dos 180 adolescentes atendidos no LTEIG, 20 se encontravam em tratamento hormonal e 120 aguardavam cirurgia. Das 60 crianças triadas, 45-50 estavam em acompanhamento e 4 já se encontravam em bloqueio hormonal. Impressiona-me a precocidade com que tais medidas são tomadas, pois o desfecho é uma cirurgia mutilatória, irreversível.

O LTEIG é o único para esse fim no Brasil, visto como recurso à saúde, com sede em São Paulo-SP e com investimento do governo do Estado. Projetos como esses requerem investimento e há dois outros em vias de instalação, em Brasília e no Mato Grosso do Sul, o que levou Alexandra Makowiski a exclamar: “Ótima notícia!”. Será?

Protocolos semelhantes são seguidos nos EUA e na França. Parecem muito práticos, voltados para a resolução de um problema e para tornar as pessoas mais felizes.

Bulamah e Kupermann (2016), em artigo intitulado A psicanálise e a clínica de pacientes transexuais, fazem um levantamento de psicanalistas que trataram desses pacientes e escreveram a respeito, evidenciando-se o quanto a condução dos casos e sua compreensão dependiam da teoria na qual eles se embasavam e também de seus preconceitos.

Tendo o inconsciente como pedra fundamental da psicanálise, considero essencial buscar se entender a engrenagem psicodinâmica na qual está enredada a criança supostamente transgênera, da qual fazem parte seus familiares, o meio social e os serviços médicos assistenciais. Acredito que teremos hoje um encontro rico e profícuo para se pensar essas questões, com as contribuições de Jean-Pierre Caillot, Jeanne Defontaine, Philippe Saielli e Maurice Hurni, tendo por base o documentário “Petite Fille”, de Sébastien Lifshitz (2020).

INTRODUÇÃO À NOSSA REFLEXÃO SOBRE PESSOAS TRANSGÊNERO

Jean-Pierre Caillot

ESTE MENINO DIZ QUE É UMA MENINA!

Vamos falar sobre os diferentes conceitos propostos por John Money dizendo respeito a gênero e sexo, a sua relação com a família Reimer, especialmente com David Reimer e seu irmão gêmeo, a sua visão sobre a pedofilia.

Abordaremos a recusa dos psicanalistas, tais como Robert Stoller e Colette Chiland (2013), a respeito da incestualidade e do incesto diante dessas famílias.

Paul-Claude Racamier enfatiza que para as pessoas transgênero, trata-se mais de uma problemática narcisista do que sexual e que de fato “a autonomia de seu ser os faz sofrer mais do que sua anatomia”. Ele nos propõe um novo conceito de “delírio no real”, como na anorexia nervosa, nas ditaduras e, acrescentemos, na síndrome de Munchhausen por procuração. Sua descoberta recente da perversão narcísica enriquece consideravelmente nossa compreensão de certos fenômenos e nossos meios no trabalho psicanalítico individual e familiar.

JOHN MONEY

Jean-Pierre Caillot

JOHN MONEY (1921-2006) é psicólogo, sexólogo. Casado por pouco tempo nos anos 1950, ele não teve filho.

Ele foi professor de psicologia médica no Centro Médico da Universidade John Hopkins em Baltimore de 1951 a 2006 e participou de pesquisas sobre os comportamentos sexuais.

Durante sua vida profissional, Money foi considerado um especialista em comportamentos sexuais, especialmente por ter demonstrado que o gênero era uma aquisição, um aprendizado, mais do que algo inato.

Assim, “a identidade de gênero” (1955) é a categorização de si mesmo como homem, mulher ou ambivalente, em função do que o sujeito sente e do que ele percebe sobre seu comportamento. Estamos falando de “transtornos de identidade de gênero”.

Money cria o termo “papel de gênero”, que ele diferencia do conceito mais tradicional de “papel dos sexos”.

A redesignação sexual de Bruce Reimer é um fracasso

Inicialmente chamado de Bruce por seus pais, depois Brenda após sua castração real aos 22 meses, e finalmente David por ele próprio na adolescência.

Em 1966, uma circuncisão malsucedida (queimadura do pênis por eletro cauterização) deixou Bruce Reimer, então com 8 meses de idade, sem pênis. “Persuadido de que se ele fosse criado como uma menina, Bruce se tornaria uma menina”, John Money aconselhou seus pais a transformá-lo em menina. A partir dessa recomendação, 14 meses depois, decidiu-se fazer do bebê uma menina: foi feita a ablação dos testículos.

Money também recomendou um tratamento hormonal pesado à base de estrogênio (o que foi feito), bem como vaginoplastia na puberdade (o que não foi feito). Ele publicou um número significativo de artigos afirmando que a redesignação foi um sucesso.

Com o caso Reimer, “Money ficou convencido de ter provado que o sexo biológico se apaga, desde que se inculca um outro ‘gênero’. ” Ele escreveu numerosos artigos consagrados a esse caso, e em 1972 publicou um livro, Man – Woman, Boy – Girl. Nele afirma que somente a educação torna os humanos sujeitos masculinos ou femininos.

Em 1997, Milton Diamond relatou que essa redesignação foi, pelo contrário, um fracasso. Money foi acusado de ter falsificado o resultado de suas pesquisas.

David Reimer declarou à imprensa: “Eu me senti como Frankenstein, uma criação de laboratório”. Desde os seis anos de idade, Money o inundava com perguntas lançadas em rajadas: “Você tem vontade de fazer sexo com meninos? Qual é a diferença entre um menino e uma menina? Você gosta do que você tem entre suas duas pernas? “Foi como uma lavagem cerebral”, David confessará mais tarde ao jornalista John Colapinto, que escreverá um livro expondo o caso, As nature made him: The boy who was raised as a girl (Como a natureza o fez: O menino que foi criado como uma menina).

Em 2000, David e seu irmão gêmeo, Brian, declaram que Money tirou várias fotos deles, nus, durante seu tratamento e os forçava a simular o ato sexual, acreditando que isso os ajudaria a construir suas respectivas identidades sexuais.

Em 2002, o irmão gêmeo de David foi encontrado morto por uma overdose de medicamentos que ele tomava para tratar sua esquizofrenia. Pouco tempo depois de ter terminado com sua mulher, David Reimer se suicidou. Seus pais declararam atribuir aos métodos de Money a responsabilidade do falecimento de seus dois filhos.

Money respondeu que a reação das mídias às revelações foi devida à extrema direita e a movimentos antifeministas. Ele declarou em particular que seus detratores acreditavam que “a masculinidade e a feminilidade eram de origem genética, de modo que o lugar das mulheres deveria ser na cozinha e na cama”.

Gregg Furth, psicanalista junguiano, coautor com John Money (1977) é apotemnófilo[1].

Money afirmava que nem os pesquisadores nem o público distinguiam entre pedofilia afetiva e pedofilia sádica. Ele acreditava que a pedofilia afetiva se baseava no amor e não no sexo. Sua opinião era que a pedofilia afetiva era causada por um excesso de amor dos pais que se tornava erótica e, portanto, não era um transtorno de comportamento.

 “Se eu fosse testemunha do caso de um menino de 10 ou 11 anos intensa e eroticamente atraído por um homem na casa dos 20 ou 30 anos, e que a relação fosse totalmente recíproca … então eu não poderia qualificá-la como patológica de forma alguma”, afirmava ele.

Colette Chiland (2013)

Chiland apresenta uma vinheta clínica de uma criança, Antoine, de 4 anos.

A autora informa que os pais dele não temiam que o filho se tornasse transexual … Antoine foi tomado em psicoterapia intensiva por um terapeuta homem de sua equipe; cada um dos pais desenvolveu um trabalho com um terapeuta diferente na cidade e, de tempos em tempos ela fazia o balanço com a criança e os pais em uma consulta conjunta. 

Sua abordagem é intrapsíquica de acordo com o modelo neurótico, como enfatiza Jeanne Defontaine.

C. Chiland acredita que os transgêneros dizem respeito à clínica do desejo e não à do traumático.

Robert Stoller

Na década de 1960, ele mostrou que uma força biológica atua nos comportamentos de gênero de uma criança desde sua mais tenra idade, independentemente do sexo atribuído no seu nascimento. Suas pesquisas sobre a transidentidade o levaram a levantar a hipótese que uma simbiose excessiva entre a mãe e seu filho combinada com uma ausência ou uma presença passiva do pai leva a uma extrema feminilidade no menino.

Observações e perguntas

John Money, no caso de Bruce Reimer, apresenta imediatamente traços psíquicos muito perturbadores:

  • Os atos assassiniais de dominação narcísica patológica em nome de um certo saber médico e incestuais de intrusão como nas cenas reais “medicalizadas” descritas pelos gêmeos, organizadas por J. Money.
  • O comportamento de Money é incestuoso e perverso como se constata em seus julgamentos “científicos” sobre a pedofilia; ele nega o abuso narcísico e sexual.

Que paralelos pode-se estabelecer entre John Money com a família Reimer e a mãe de Sacha (filme de Sébastien Lifshitz, 2020) com sua própria família?

Que pontos em comum existem entre essas duas situações e as que se pode observar na síndrome de Munchhausen por procuração (delirar no corpo médico), na anorexia nervosa (delirar em seu próprio corpo) e nas ditaduras (delirar no povo)?

 Trata-se de um “delírio no real” como propõe Racamier?

Trata-se para a mãe da criança transgênero delirar no seu filho.

Citemos este autor em sua compreensão inovadora da problemática narcísica ao invés de sexual dos transexuais:

 “Quanto menos um sujeito se sente seguro de seu lugar originário, mais ele teme a ingerência materna, mais sua angústia é profunda e difusa, e mais ele agitará, como um logro, diante de nós e de si mesmo, os oriflamas[2] de um conflito completamente diferente: sexual, por exemplo, e até mesmo anatomicamente sexual. É assim que os transexualistas, que brandem com toda força o pênis que eles (elas) têm a mais ou que elas (eles) têm a menos, é na verdade por sua própria existência que se apavoram: a autonomia de seu ser os faz sofrer mais do que sua anatomia” (P.-C. Racamier ” Le génie des origines“, p. 163).

Reflitamos juntos sobre as seguintes questões:

  • As estruturas psicótico-perversas, paranoicas-perversas operam colocando a perversão a serviço de um delírio patente ou escondido (um cripto-delírio)?
  • Já, para Winnicott, psicanalista precursor (Distortion du moi en fonction du vrai et du faux ‘self’. In: Processus de maturation chez l’enfant, Paris: Payot, 1960, pp.115-131), os fenômenos de dominação e de sedução maternos submetem o bebê à sua mãe. A criança é desobjetalizada.
  • Lembremos também a poderosa tendência de algumas dessas famílias de forçar as instituições, o social e o político a compartilhar a afirmação transgênero materna, familiar.
  • Por fim, sublinhemos a forte agressividade, a violência assassina condenável contra o conjunto das pessoas LGBTIQ que têm direito, bem evidentemente, como todos os cidadãos, ao respeito, à uma proteção rigorosa da sua integridade física e psíquica.
  • Quais são hoje as proposições éticas da psicanálise em relação às crianças e adultos transgênero?
  • Não somos convidados a pensar em novas elaborações, indicações e práticas médicas, psiquiátricas e psicanalíticas?

QUANDO A MORTE FAZ SOFRER OS VIVOS: “PEQUENA GAROTA” E LUTO PATOLÓGICO

Philippe Saielli

Quanto menos o sujeito se sente seguro de seu assentamento original, mais ele teme a ingerência materna, mais sua angústia é profunda e difusa e mais ele agitará, como um engodo, diante de nós e de si mesmo, as auriflamas de um conflito completamente diferente: sexual, por exemplo, e até anatomicamente sexual. É assim que os transexualistas, que brandem com toda a força o pênis que têm a mais ou que têm a menos, é na verdade por sua própria existência que eles se apavoram: a autonomia de seu ser os faz sofrer mais do que sua anatomia (Racamier, ” Le conflit des origines“, p. 163)

O documentário que começa com a consulta da mãe e de seu filho com o médico de família é uma cena fundamental que poderia ilustrar um funcionamento normal e transicional. Nesse primeiro momento, as falas de Sasha, relatadas por sua mãe e que a criança repete desde a idade de 3 anos – “quando eu for crescido[3], serei uma menina” – são ambíguas. A ambiguidade aqui consiste no fato que essa frase reúne qualidades opostas entre as quais não há como escolher: entre menino (“crescido“, no masculino) e menina.

A postura do médico de família se abre para um dos únicos momentos do filme em que se desdobra um espaço de palavras de fantasiação e de simbolização, ou seja, um espaço que favorece o desdobramento do intrapsíquico. Karine, a mãe, cria então uma ligação entre o sofrimento de Sasha e sua própria história como mulher e mãe. Ao clínico geral, esta última conta que desejou a todo custo ter uma menina durante sua gravidez e que, no seu nascimento, ela ficou “muito decepcionada ao saber que Sasha era um menino“.

Numa cena subsequente em que a mãe fala sozinha em frente à câmera, ela deixa entrever igualmente a existência de perda de filhos: “Eu me perguntei. Pensei comigo mesma: não foi porque você queria tanto ter uma menina, que isso aconteceu? Depois eu disse para mim mesma: como antes da Sasha eu tinha perdido duas meninas, disse para mim mesma que Sasha encontrou o método para se manter vivo (…) “

Podemos entender essa fala como a consequência de uma problemática de engendramento patológico. A problemática seria do tipo: uma menina não deve deixar o corpo materno, se ela o deixa, ela morre. É preciso então usar de uma artimanha, ” nascer menino, mas ser menina”.

Quando uma perda catastrófica impede todo o trabalho de luto, no caso a perda de duas filhas, o traumatismo não elaborado pode repercutir na geração seguinte. Para qualificar esses fenômenos como repercussões do traumatismo dos pais sobre seus filhos, H. Vermorel fala de uma criança de substituição e P.C. Racamier fala de criança “tapa-luto” ou “para-luto”. Uma ideia fundamental de Racamier é que um luto que não é feito por um sujeito vai se deslocar num outro e nele se transformar numa névoa de afetos e em oclusão de fantasias.

Queremos aqui levantar a hipótese de que este documentário ilustra a jornada bem descrita por Racamier da passagem do intrapsíquico ao transubjetivo patológico. Racamier mostrou o quanto os psicanalistas podem se sentir desmunidos diante dessas questões que se situam aquém da elaboração fantasiosa.

O que é transportado do psiquismo da mãe ao da criança e da família?

Diremos com Racamier que Sasha é um receptor, apesar de si mesmo, de um processo amalgamado herdado de sua mãe. “O transexualismo se impõe como a única evidência identitária possível (embora quase delirante) para sujeitos cuja mãe não efetuou o luto que lhe incumbia de uma ilusão louca” (p. 68).

Com este documentário temos em imagem a maneira com a qual se desenrola este processo amalgamado que vai atravessar todo o grupo familiar e mesmo a sociedade.

Retornemos a este processo amalgamado que permite um luto expulsado. O amálgama é composto por um luto já desfigurado e uma depressão ainda não configurada. No psiquismo, esse amálgama, dirá Racamier, é desfantasiado, desmentalizado, privado de formas psiquicamente reconhecíveis, um objeto psíquico interno se coagulou e é ele que vai ser submetido à expulsão; eis, portanto, o “processo amalgamado”.

As manobras de expulsão são transubjetivas; elas transportam um trabalho que foi recusado, mas elas dissimulam ou travestem o objeto.

Retomemos, primeiramente um amálgama – luto desfantasiado e depressão não experimentada – que vai levar à criança de substituição. Ela se torna então portadora de uma injunção simultânea e antagônica, que podemos resumir da seguinte forma: essa menina não será mortal porque ela estará no corpo de um menino. Ou, para retomar as falas da mãe de Sasha: “Sasha é uma menina presa num corpo de menino“.

O processo amalgamado na origem do luto expulsado é uma defesa que contamina o conjunto da família. Assim, a família se organiza em torno de uma convicção comum, que consiste em fazer com que a escola e a sociedade como um todo reconheçam que “Sasha é uma menina presa num corpo de menino”. Essa postura de combate compartilhada por todos tem a vantagem de criar um corpo comum organizado em torno de uma convicção ideológica que oferece uma defesa contra a angústia de desmoronamento e a angústia de perda de objeto.

Assim Sasha se encontra sozinho vivendo, sem que o queira, um problema insolúvel: se ele se coloca no lugar que lhe é designado: é o de uma morta, e não é o seu; se ele se coloca em seu próprio lugar único: é trair sua mãe.

A hipótese aqui é considerar que o objeto interno “filha morta” da mãe é injetado no filho de substituição. Sasha é ao mesmo tempo anulado enquanto sujeito autônomo e grandioso, como objeto privilegiado do interesse da mãe e como portador de um combate.

Para retomar as falas da mãe: “Estou convencida de que todos temos um papel a desempenhar na vida, em um momento ou outro, que todos temos uma missão a cumprir, e digo a mim mesma que Sasha, ela está aqui para ajudar a mudar as mentalidades e que eu estou aqui para ajudá-la”.

Quais são as consequências deste luto expulsado?

Uma sedução narcísica eterna que cria um corpo comum.

Racamier distingue uma sedução narcísica original normal, necessária, que chega naturalmente a seu termo, declinando com a evolução do desenvolvimento da vida psíquica da criança, e uma sedução narcísica “a-normal”. Segundo ele, esta última se caracteriza por sua dimensão alienante: neste caso, os dois parceiros não estão ligados, mas “ligadurados” por uma sedução que não acaba. No entanto, mesmo que a relação genitor(a)-filho seja assimétrica, o filho Sasha não é tão passivo quanto se poderia acreditar e participa e se beneficia dessa busca pelo uníssono narcísico.

Uma dominação excessiva que é anti autonomia

Muitas vezes neste documentário, pode-se perguntar quem fala? Sacha, dispõe ele/ela de uma palavra que lhe seja própria? As emoções parecem passar de uma a outro sem palavra. Sacha se calca sobre a palavra materna. Pode-se questionar sobre a autonomia da qual Sasha disponha para se expressar e tentar elaborar um pensamento que lhe seja próprio. Sasha não parece unicamente orientada em direção ao fato de tentar satisfazer sua mãe, de fazê-la feliz?

O desdobramento dessa sedução narcísica onde o “eu” é muitas vezes esmagado pelos pronomes indeterminados “se” ou “nós” oblitera qualquer espaço para a ambiguidade, especialmente no que diz respeito à questão de gênero. A psiquiatra infantil explora pouco, ou mesmo nada, o vivido subjetivo de Sasha. Isto é, por exemplo, o que significa para Sasha ser menina ou ser menino? Como ela poderia, por exemplo, desenhá-lo? Que relato de sua história pode fazer?

Os comentários feitos pela mãe ao final do documentário atestam essa indiferenciação sem fim. “Eu sei que em algum momento Sasha será atacada por sua diferença. (…) Seu caráter vai ajudá-la, mas não é isso que mais irá protegê-la. Como eu lhe disse, de qualquer modo, é seu combate, mas é também o meu, eu sei que será o combate de minha vida.” A mãe continua dizendo: “Estou convencida de que todos temos um papel a desempenhar na vida, em um momento ou outro, que todos temos uma missão a cumprir, e digo a mim mesma que Sasha, ela está aqui para ajudar a mudar as mentalidades e que eu estou aqui para ajudá-la”.

Esta sequência não ilustra perfeitamente as palavras de Paul-Claude Racamier que considera que com uma sedução narcísica a-normal e a dominação, o genitor(a) ganharia em narcisismo, enquanto a criança perderia em autonomia e reconhecimento de identidade. Ela seria reduzida ao estado do objeto narcísico do genitor(a): “instrumento de valor, mas instrumento“, escreve P.C. Racamier (p. 35). No entanto, ele precisa que a criança não é tão passiva quanto se poderia crer. Na verdade, ela pode encontrar benefícios secundários não negligenciáveis nesta situação: ela pode desfrutar de se sentir indispensável e de perceber a exclusividade da paixão.

ENTRE X OU Y? SERÁ QUE REALMENTE TEMOS ESCOLHA A NÃO SER À CUSTA DE UM LOGRO?

Jeanne Defontaine

Algumas observações sobre o filme do diretor Sebastian Lifshitz intitulado “Pequena Garota”. Sasha apresenta o que a psiquiatria chama de “disforia de gênero”, ele é, segundo sua mãe, uma menina trancada num corpo de menino.

Madame consulta um médico para seu filho de sete anos, que desde os três expressaria seu desejo de ser uma menina. Por ocasião desses exames, tudo o que é dito deriva do discurso materno que retoma junto ao médico as supostas palavras da criança, convencida de que ela deve tomar todas as providências possíveis junto aos serviços médicos e escolares para que seu filho seja tratado como uma menina.

Podemos perceber aqui algo que deriva do desejo materno que não leva em conta o caráter fugaz dos jogos e devaneios que povoam necessariamente o crescimento psíquico da infância e que, não os tomando como tal, os põe em ato para que seu autor, seu filho Sasha seja reconhecido como uma menina. Quem não experimentou no decorrer de seu desenvolvimento essas fantasias de pertencer a outro sexo?

Mas aqui, à única veleidade de ser uma menina, responde-se: “Sim, com a ajuda da medicina e da cirurgia você se tornará uma! ”. A partir daí a mãe se entregará a uma cascata de atos, chegando a solicitar junto a um psiquiatra um documento atestando o caráter transgênero de seu filho, isso para obrigar a escola a inscrevê-lo como uma menina. Entendemos que diante de um tal pedido, a instituição escolar possa expressar certa relutância, mas essa recusa é vivida como uma verdadeira perseguição por ela.

Para esse filho é o reinado da confusão, ele chora porque a mãe está surda ao problema indizível que isso lhe suscita, porque nesse combate engajado por sua mãe, ele está ameaçado de perder seu ambiente escolar que pode também ser assegurador. No entanto, ele fica sem palavras diante da determinação materna: nós o vemos derramando lágrimas e isso porque ele tem a palavra interditada porque qualquer palavra de sua parte comporta uma ameaça: ferir sua mãe, contrariá-la em seu desejo. Sob a dominação e a autoridade maternas, ele é destituído de sua capacidade de pensar.

Ao falar por ele, ela não lhe permite que ele tenha acesso a uma palavra que seja sua e, assim, evitará o menor desacordo, abafará o menor conflito.

Não lhe é dado tempo para que possa ser ouvido. Por sua vez, nos perguntamos que perigo representa para ele o fato de dizer o que ele pensa, especialmente mergulhado como ele está na ambiguidade, por exemplo, qual seria o efeito para a mãe dizer que às vezes ele está contente de ser um menino? Teria ele apenas o direito de dizer isso?

A mesma atitude está presente na qualidade do enquadre que torna a psiquiatra infantil surda ao estado emocional da criança: o pressuposto presente nela é que só o discurso materno faz sentido. Porque só ele é portador de verdade: em nenhum momento a profissional considera um cara a cara com a criança. Supostamente a palavra de Madame deve abranger o discurso de todos: o que é, então, senão o caráter próprio do ant’édipo patológico?

A consulta psiquiátrica banal geralmente consiste em ter uma entrevista individual, depois conjugal e depois familiar, mas aqui só a palavra materna conta. O déficit psiquiátrico dessa consulta consiste em ter o pressuposto de que somente essa palavra do adulto revela todos os aspectos da problemática. Não se poderia considerar que a própria profissional é tomada ela própria por um pressuposto de natureza incestual, em total colusão com o da mãe: “Somos três, somos iguais e só podemos estar de acordo”.

O que está em curto circuito na atitude materna em relação ao filho é o caminho psíquico necessário para que ele possa se distanciar do desejo parental para pensar por si mesmo. Sua mãe não lhe deixa espaço psíquico para se apoderar dessas palavras e ter a liberdade de poder se desembaraçar delas. Ela não lhe dá tempo para abrir um caminho psíquico pessoal para conseguir se separar dessa ideologia que atinge uma dimensão familiar e encontrar um caminho que lhe seja pessoal.

Com a dúvida provavelmente relativa sobre sua identidade sexual, se confronta a convicção materna. Afirmar sua palavra para esta criança é correr o risco de ser rejeitado por sua mãe. É por isso que ele chora: o direito de pensar é interditado a Sasha porque pensar poderia matá-la. Seu amor por ela vale o sacrifício de seu pensamento? O espaço de intimidade próprio para permitir-lhe descobrir o objeto de seu desejo está preso nas tramas do desejo materno, do qual ele não pode se desvencilhar, sob pena de perder seu amor. Mas, como sabemos, o interdito de pensar é específico do clima incestuoso.

“Sasha está perdendo sua infância”, diz a mãe ao médico, mas será por ele não ser visto como uma menina? Não, ele perde sua infância porque é invadido, intoxicado por uma mãe que não suporta que ele não corresponda às suas expectativas. Mas tudo isso obedece a um paradoxo porque Sasha tem, ao mesmo tempo, no seio de sua família, o estatuto de ídolo e de objeto fetiche.

Podemos facilmente evocar a dominação, mas igualmente um sopro de perversão dizendo respeito a sua utilização: Na verdade, aprendemos que antes do nascimento de Sasha duas bebês meninas morreram ao nascer, a transformação de Sasha teria por finalidade colmatar na mãe o luto impossível de suas filhas desaparecidas? É então que Sasha assume o estatuto de para-luto para sua mãe e provavelmente para a família.

Muitos sacrifícios são demandados a Sasha, o de seu pensamento, mas igualmente o de aceitar as intrusões e as feridas engendradas pela intervenção médica em seu corpo, o tratamento hormonal para bloquear sua puberdade, intervenções cirúrgicas que vão cortar na carne. Quando os genes serão substituídos?

Sacrificada também a experiência orgástica de possuir um órgão do qual todo menino se orgulha. Na relação de Sasha com sua mãe, o valor acordado ao pênis é reduzido a nada, ele é objeto de uma verdadeira rejeição. Para Sasha, portanto, está interditado pensar, falar e também ter um corpo: podemos falar legitimamente de domínio materno sobre o corpo e, portanto, nele, de uma verdadeira desapropriação de seu próprio corpo.

Mas, no final das contas, tudo isso não passa de uma bobagem e o logro está onipresente: porque o que não se diz nunca é que, executando a mutilação prescrita para se tornar menina, ele não se torna uma menina! Aqui está o escotoma contra o qual a ideologia transgênero irá se confrontar: ele nunca será uma menina, mas deve se contentar em assumir a aparência porque, apesar das injeções de hormônios que mantêm esse logro, ele continuará a ser fisiologicamente um menino: o seu genoma permanecerá imutável e, além disso, nunca poderá, apesar da sua aparência, experimentar todos os sentimentos relativos ao “estar no mundo” feminino.

Para concluir, podemos dizer que com este documentário a função militante é omnipresente: um filme de propaganda da causa transgênero a fim de apagar o contexto preciso no qual ele se situa, que é o da indiferenciação, da abolição dos limites, um contexto ao mesmo tempo perverso e psicótico atuante que deriva do ant’édipo patológico.

ENTRE PARADOXOS E MILITÂNCIA

Maurice Hurni

Contribuição para a discussão da APAOR com o COWAP – Brasil sobre “Um menino diz que é uma menina! Delírio ou realidade? ”

Primeiro paradoxo: “Uma construção social que não é uma construção social”

O conceito de “disforia de gênero” se apoia em trabalhos de Foucault, Derrida, etc., para quem a sexualidade seria essencialmente uma construção social, quase independente da biologia. Essa concepção liberaria a sexualidade de seus entraves, tanto biológicos quanto médicos. Contudo, todo o documentário se pretende uma defesa à existência de uma doença, reconhecida pelo manual americano das doenças mentais, DSM-V, e catalogada sob o termo de “disforia de gênero”. E é de fato o atestado médico obtido da médica-psiquiatra que será a peça central de uma luta desde então conquistadora contra instâncias sociais ditas repressivas.

Esta “entidade” bizarra é, portanto, alternadamente uma “doença” que se beneficia de um reconhecimento médico ou um simples “jeito de ser” baseado na validação do único sentimento narcísico de se sentir menino ou menina, em outras palavras, uma doença-não-doença. Não se sabe do que se está falando.

Uma outra formulação diria que a sexualidade é uma construção social – mas pela disforia de gênero.

Esses paradoxos confundem o interlocutor e o tornam confuso. Eles rapidamente o levam a desistir de esclarecer os termos utilizados ​​e a abdicar de qualquer veleidade de compreensão.

Segundo paradoxo: “Uma liberação que tranca”

O documentário pretende ser um hino à liberação de uma sexualidade injustamente reprimida. Mas essa “liberação” leva ao resultado paradoxal de trancar essa criança num diagnóstico do qual duvida-se que possa se desvencilhar um dia.

Terceiro paradoxo: “Uma não castração que castra”

Segundo Freud, a constatação que faz a criança de pertencer a apenas um dos dois sexos equivale a uma castração simbólica, um limite intransponível. Essa castração simbólica constitui o pilar do complexo de Édipo.

Ao pretender que um menino possa ser uma menina, os defensores da “disforia de gênero” brincam com essa limitação.

O paradoxo implica que esse “jogo” termine mal, com a ocorrência da castração “real”. Em outras palavras, evitar a castração simbólica resulta numa castração na realidade.

Só o pai de Sasha, ele simbolicamente bastante “castrado”, emite um vago grunhido preocupado com a futura “morfologia” de Sasha que, na lógica das coisas, deverá necessariamente ser “adaptada”.

Observe-se que a castração real nunca é mencionada como tal. São usadas apenas paráfrases como “bloquear a puberdade”, “evitar o crescimento de pelos, o pomo de Adão”.

Quarto paradoxo: “um documentário que não é documentário”

Os próprios apresentadores se veem embaraçados para apresentar o que eles chamam tanto de “filme”, como de “documentário”. Certamente não é um filme: não é ficção e os personagens são bem reais. Também não é um (verdadeiro) documentário: não há nenhuma distância, nenhuma objetividade, nenhum outro ponto de vista.

Uma militância sem forma

Poder-se-ia dizer que se trata de um “documentário militante”. Mas o que um tal termo implica? Implica a existência de uma “causa” à qual esse documentário serviria. E qual é a causa? É muito provável que a descoberta da entidade “disforia de gênero em crianças” se inscreva em seguimento a outras reivindicações sexuais prévias: reconhecimento e melhor aceitação da homossexualidade, depois “PACS” (pacto de parceria civil), depois casamento homossexual, depois adoção e recentemente procriação medicamente assistida (PMA) para casais de lésbicas. Lutas jurídicas, mas também lutas sociais visando “mudar as mentalidades” ao combater as atitudes ou as opiniões hostis.

Em apoio a esse esclarecimento, as falas do realizador que evoca, no início do filme, seu projeto através do qual ele procurava uma família com uma criança transgênero. Em outras palavras, pode-se dizer que Sasha e sua família foram utilizados para ilustrar e defender a causa “transgênero” e mais especificamente “transgênero em crianças”.

A militância se situa nos antípodas da psicanálise. Ela refuta as dúvidas e as interrogações e se atém a palavras de ordem.

Um melhor entendimento desta “causa”, de sua ideologia e objetivos que ela persegue seria certamente necessário, mas depassa o enquadre de nossas competências (e desta apresentação). Observemos simplesmente que esta causa mobiliza meios consideráveis, particularmente mediáticos, a nível mundial, postos ao serviço da propagação e da difusão desta doutrina. Meios que até então nenhuma causa conheceu até agora – exceção feita talvez à causa comunista. Pelo que é em vão que se procuraria um “Manifesto” que a definiria. Poder-se-ia ver aí um último paradoxo, o de “uma causa que não seria uma causa”?


[1] Apotemnofilia é uma parafilia caracterizada pelo desejo de se ver amputado em uma ou mais partes do corpo.

Relacionado à apotemnofilia, tem-se a acrotomofilia, o devotee e o wannabe.

Acrotomofilia é a preferência sexual por pessoas que tenham alguma parte de seus corpos amputada, pois a excitação é proporcionada justamente pela falta daquela parte. Quando a excitação acontece quando um membro do próprio corpo é amputado, chama-se apotemnofilia ou amelotatista.

Devotee é o indivíduo que é atraído sexualmente por pessoas amputadas.

Wannabe significa “querer ser” (“wanna” significando querer e “be”, ser).

Wannabe, em relação à apotemnofilia, é alguém que quer se tornar um ser amputado, certamente sem razão médica. Alguns wannabes são pretenders (se fazem de amputados). Para os Wannabes a amputação é uma necessidade. Alguns chegam ao extremo para conseguir a amputação desejada, pois sentem que o membro sadio os incomoda.

[2] Estandarte dos antigos reis de França.

[3] Em português, grande é adjetivo que se refere tanto ao masculino, quanto ao feminino, em francês não, grand, grande. Optou-se por crescido para favorecer a intenção do autor no que diz respeito à ambiguidade da construção da frase de Sacha.

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Escrito por
Maria do Carmo Cintra de Almeida Prado
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Maria do Carmo Cintra de Almeida Prado

Doutora em Psicologia Clínica (PUC-Rio), membro efetivo e docente da Sociedade Psicanalítica do Rio de Janeiro (SPRJ), membro aderente da Académie Psychanalytique Autour de l’Oeuvre de Racamier (APAOR), especialista em terapia psicanalítica de casal e família, especialista em avaliação psicológica/psicodiagnóstico, psicóloga aposentada do Instituto de Psicologia da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, coordenadora dos Setores de Psicodiagnóstico (1982-2018) e de Terapia de Família (1990-2018) da Unidade Docente Assistencial de Psiquiatria do Hospital Universitário Pedro Ernesto/UERJ.